NOSSA SENHORA DOS MÁRTIRES
Dom Afonso Henriques, primeiro monarca português, via com
grande mágoa tremularem as luas maometanas na ilustre cidade de Lisboa, e o
desejo de libertar a cidade do jugo odioso dos inimigos de sua fé aumentava dia
a dia em seu piedoso coração. Um dia, quando estava entregue a esses
pensamentos, eis que surge, no vasto oceano, a verdadeira Estrela do Mar, Maria
Santíssima, que, representada em uma devota imagem, vem acompanhando uma
ostentosa armada de cruzados, composta de alemães, franceses e ingleses. Vinham
dos portos do norte com o fim de resgatar a Terra Santa do poder dos bárbaros
e, inesperadamente, por disposição divina, chegaram à costa de Portugal. O
piedoso monarca, depois de saber qual era o fim daquela armada, convida-os à
conquista de Lisboa, porque, explicou-lhes ele, seria muito do agrado do Senhor
contribuírem para a exaltação da santa religião em um reino que o mesmo Senhor
pouco antes fundara de maneira tão gloriosa. Os cruzados aceitaram o convite e
se dispuseram para tão ilustre feito, de cujo resultado não duvidou o rei,
quando soube que eles traziam na armada, como sua protetora, uma imagem de
Nossa Senhora. Deixando, pois, as naus, os cruzados desembarcaram nas praias de
Lisboa, conduzindo igualmente para terra a sagrada imagem, que desde o
princípio da viagem lhes havia servido de consoladora companhia. O lugar onde
hoje se acha construído o templo de São Vicente de Fora é ocupado pela divisão
dos cruzados; e a divisão dos portugueses está no lugar em que se construiu o
santuário onde hoje é venerada a imagem de que nos ocupamos, a qual foi
colocada nesse lugar com a permissão do general dos cruzados, Guilherme da
Longa Espada. Transportado de júbilo por possuir em seu arraial tão precioso
tesouro, o rei Afonso, confiando firmemente na proteção da Santíssima Virgem,
fez o voto de erigir em sua honra um santuário, que aos vindouros patenteasse
seu reconhecimento, se por intercessão de tão poderosa protetora conseguisse a
suspirada vitória. Quando o rei formava o plano do grande ataque, que havia de
decidir a conquista de Lisboa, inesperadamente é informado de que um reforço
considerável de infiéis avançava pelo lado de Sacavem, com o fim de socorrer os
irmãos de armas e malograr os projetos do rei. Longe, porém, de se aterrar com
tão inesperada nova, o rei julga-a como feliz anúncio de suas futuras vitórias,
porque escudado com a proteção de Maria Santíssima, Senhora nossa, nada tem a
temer dos sectários de Mafoma: sai ao encontro do tal reforço, e tão
valorosamente o investe que muitos dos inimigos acham desprezível sepulcro no
mesmo lugar em que pouco antes se prometiam mutuamente a vitória. O rei Afonso
reconhece no feliz resultado desse primeiro conflito a proteção visível da
Santíssima Virgem, e, solene testemunho de gratidão, manda ali mesmo edificar
uma pequena capela em honra de Maria Santíssima. Na tomada de Lisboa, os
soldados de Afonso com seus aliados foram novamente auxiliados pela puríssima
Mãe de Deus, que os protegeu até entrarem na posse da sede da monarquia dos
lusos, cujas portas lhes foram gloriosamente abertas no dia 25 de outubro de
1147, dia memorável em que, entrando em Lisboa o exército vencedor, os
cristãos, prostrados diante da verdadeira Judite, sua libertadora, representada
naquela imagem, a saudaram agradecidos como os betulianos à vencedora de
Holofernes – Tu és a glória de Lisboa, a alegria de seus habitantes, a honra do
povo português. Libertada Lisboa do bárbaro jugo pela poderosa proteção de
Maria Santíssima, o rei tratou zeloso do bem-estar daqueles generosos cruzados
que tanto o haviam ajudado em sua conquista, e, não se esquecendo dos mortos,
procurou um lugar decente em que pudessem ser sepultados os corpos daqueles a
quem a piedade dos fiéis já chamava mártires, por terem dado com a vida um
testemunho de sua fé. Benzido o terreno, foram sepultados os restos mortais dos
devotos guerreiros falecidos na batalha, e os sobreviventes construíram uma
capela para a qual transladaram a imagem de Nossa Senhora. E, para maior
veneração da Santíssima Virgem, edificaram na proximidade da capela umas
pequenas celas para habitação dos vários sacerdotes ingleses, a quem presidia o
venerável sacerdote Gilberto, com o fim de se empregarem cotidianamente nos
louvores da Mãe de Deus. Logo depois, tratou o agradecido monarca de dar
cumprimento fiel ao voto que tinha feito à Santíssima Virgem: manda levantar em
seu louvor um santuário dedicado à Mãe de Deus com a invocação ou título de
Nossa Senhora dos Mártires, para que ali fosse colocada a veneranda imagem, por
ser o templo edificado no lugar em que estavam sepultados os valorosos cristãos
que haviam morrido em defesa da fé e eram chamados mártires. O rei esmerou-se
na construção desse santuário, que seria santificado pela real presença de Deus
e aformoseado com a imagem de sua Mãe Santíssima. Os muitos terremotos que
lastimosamente se fizeram sentir em Lisboa, em diferentes ocasiões, arruinaram
mais de uma vez esse majestoso santuário, que sempre foi reparado. A última
reconstrução foi concluída em 18 de março de 1774, e nesse mesmo dia
transladou-se para lá a imagem de Nossa Senhora dos Mártires, que ali está até
hoje. Esta é a origem do título Nossa Senhora dos Mártires, que por outros
motivos já lhe era sumamente glorioso, porque, sendo ela a Mãe do maior dos
Mártires, Nosso Senhor Jesus Cristo, sua alma santíssima sentiu todos os
tormentos da paixão de seu Filho, e a ímpia lançada, que o Filho morto já não
sentiu, foi cravada em sua puríssima alma. É a Rainha dos Mártires, como lhe
chama a Santa Igreja, porque por seu martírio inigualável é a fortaleza dos
mártires em seus combates, e a consoladora dos que vivem martirizados pelos
trabalhos e sofrimentos desta vida.
FONTE:
http://www.mariamaedaigreja.net/
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